quinta-feira, 19 de maio de 2011

Apontamento ao Regime da Responsabilidade por Danos Ambientais


O D.L. n.º 147/2008, de 29 de Julho, estabeleceu o Regime da Responsabilidade por Danos Ambientais (doravante RRDA), transpondo para a ordem jurídica portuguesa a Directiva n.º 2004/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Outubro, que aprovou, com base no princípio do poluidor-pagador, o regime relativo à responsabilidade ambiental aplicável à prevenção e reparação de danos ambientais (com a alteração que lhe foi introduzida pela Directiva n.º 2006/21/CE).

Trata-se, por um lado, de um regime de responsabilidade civil subjectiva e objectiva nos termos do qual os operadores poluidores ficam obrigados a indemnizar os indivíduos lesados pelos danos sofridos por via de um componente ambiental. Por outro lado de um regime de responsabilidade administrativa destinado a reparar os danos causados ao ambiente perante toda a colectividade.

Podemos distinguir dois tipos de dano neste regime, os danos ambientais e os danos ecológicos. Entendendo-se por danos ambientais, os danos causados às pessoas através do ambiente, e por danos ecológicos, os danos causados ao ambiente perante a colectividade. A responsabilidade pelos danos ambientais (responsabilidade civil) é regulada pelos artigos 7.º a 10.º RRDA, sendo a responsabilidade pelos danos ecológicos (responsabilidade administrativa) regulada pelos artigos 11.º e seguintes RRDA. A autonomização do dano ecológico do dano ambiental não existia no ordenamento jurídico português antes do RRDA. A lacuna terá sido fruto de um concurso de equívocos, uma vez que, por um lado, a Constituição não distingue as duas realidades no artigo 52.º/3; por outro, a Lei de Bases do Ambiente revela uma perspectiva individualista ou grupal do dano ambiental (artigo 40.º/4 e 5); e, ainda, porque a Lei da participação procedimental e da acção popular ignora a diferença entre interesses individuais homogéneos e interesses de fruição de bens colectivos, reduzindo o regime de indemnização aos primeiros (artigo 22.º n.º2).[1] 
   
No que toca ao âmbito objectivo de aplicação do RRDA, este último alargou um pouco o âmbito ao determinar no seu artigo 11.º como danos ecológicos todos os danos causados: à água; ao solo; e às espécies e habitats protegidos pelo ordenamento nacional (na Directiva apenas constam as espécies e habitats protegidos ao abrigo da Rede Natura 2000. Contudo, ainda que o RRDA tenha alargado um pouco o âmbito objectivo de aplicação, manteve de fora os danos causados ao ar e ao subsolo como danos ecológicos. Carla Amado Gomes apresenta a este respeito uma forte crítica, afirmando que, o RRDA emitido em razão de uma obrigação de transposição da Directiva n.º 2004/35/CE, bem como, de desenvolvimento do regime de responsabilização sumariamente estabelecido pela Lei de Bases do Ambiente, e ainda no quadro de tutela constitucional do ambiente, não pode estabelecer de forma arbitraria distinções entre bens ambientais merecedores de tutela preventiva, reconstitutiva e compensatória.
Constando do artigo 6.º da Lei de Bases do Ambiente, como bens ambientais, o ar, a luz, a água, o solo vivo e o subsolo, a flora e a fauna, e impondo a Constituição, no seu artigo 66.º n.º2 alínea a), como tarefa do Estado e demais entidades públicas a prevenção da poluição, não fazendo distinção entre os bens ambientais afectados, a desconsideração por certos elementos por parte do RRDA, apresenta-se como inaceitável. Nesta senda, no entendimento da Prof. Carla Amado Gomes, temos dois caminhos possíveis: ou se conclui pela ilegalidade reforçada do RRDA (artigos 280.º/2/a) e 281.º/1.º/b) da Constituição) por violar a Lei de Bases do Ambiente na parte em que omite a referência aos bens ambientais ar e subsolo; ou, procede-se a uma interpretação útil, ainda que forçada, do RRDA conforme à Lei de Bases do Ambiente e à Constituição e considera-se como dano ecológico a degradação das condições ecológicas do ar e do subsolo, aplicando-se também nestes casos o RRDA.

O RRDA para além de ter uma vertente de reparação dos danos tem ainda uma vertente de prevenção, estipulando no artigo 14.º as medidas de prevenção a ser adoptadas pelo operador sempre que esteja perante a ameaça iminente de um dano. A noção de iminência neste caso não é estritamente temporal, é também circunstancial, isto é, o dano não será iminente apenas por se considerar como prestes a acontecer mas antes porque existe um conjunto de pressupostos que permita prever, com grau de certeza razoável o surgimento do dano (artigo 11.º/1/b9 e 5.º RRDA).
Por fim, o RRDA permite que qualquer interessado/lesado se dirija directamente ao operador ou à Administração com vista à reparação.


[1] CARLA AMADO GOMES, “A responsabilidade civil por dano ecológico – Reflexos preliminares sobre o novo regime instituído pelo DL 147/2008, 29 de Julho”, in O que há de novo no Direito do Ambiente? Actas das Jornadas de Direito do Ambiente, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 15 de Outubro de 2008, Lisboa 2009, pp. 240 – 241.




Andreia Luz, n.º 17184, subturma 7

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